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Javier Milei: Um 'mini-Trump' ou um fenômeno argentino?
Ambos são diretos, enfáticos e por vezes obscenos. Ambos são saudosistas às glórias passadas e foram construídos a partir dos meios de comunicação com ódio visceral à esquerda e aos políticos. Ainda assim, equiparar Javier Milei a Donald Trump pode ser um pouco forçado.
O argentino Milei, em suas palavras o "primeiro presidente liberal libertário da história da Humanidade", é, de certa forma, uma expressão local de uma corrente global e por isso é comparado ao ex-presidente dos Estados Unidos.
Ambos cultivam o mito do "outsider", ganharam notoriedade a partir das grandes mídias e fazem parte de uma nova extrema direita que tem outros representantes em Jair Bolsonaro e no partido Vox, da Espanha.
Por estes motivos, Milei é classificado como um "mini Trump" ou "Trump dos Pampas".
No entanto, sua vitória com 55% dos votos no último domingo (19) está profundamente enraizada em circunstâncias locais: o antiperonismo e a revisão da narrativa sobre a ditadura na Argentina. Mas, acima de tudo, a economia.
"Há uma semelhança familiar, sem dúvida, mas é um erro simplesmente subsumi-los ao mesmo movimento, sem levar em conta as particularidades locais", disse à AFP Gabriel Vommaro, doutor em sociologia e analista político.
A opinião é corroborada por Michael Shifter, pesquisador da instituição Diálogo Interamericano, com sede em Washington, para quem é "um pouco forçado" compará-los, uma vez que Milei é produto "da profundidade da crise argentina e o desespero generalizado que o povo sente".
- A singularidade de Milei -
A Argentina, imersa em sua pior crise em 20 anos, com uma inflação anual de 143% e que registra 40% de sua população na pobreza, votou de forma contundente neste candidato que prometeu uma mudança radical no modelo econômico.
Para explicar sua vitória, o analista Carlos Germano considera que, apesar de Milei ter um discurso de direita, o foco deve ser no "cansaço e falta de previsibilidade" sofridos pelos argentinos.
Vommaro destacou, por sua vez, que "Milei é realmente um antiestablishment emergente", ao contrário de Trump e Bolsonaro, e lembrou que no Congresso, o argentino conta apenas com apoio da terceira minoria.
Para Shifter, "Milei é um libertário e Trump está mais longe de ser um libertário do que se pode imaginar".
Segundo o presidente eleito argentino, o livre mercado deve determinar todas as relações comerciais, enquanto o ex-presidente americano foi um nacionalista que defendeu o protecionismo e a indústria local.
Por fim, nem Trump nem Bolsonaro chegaram a defender a eliminação do Estado na esfera econômica e "dinamitar" o Banco Central, que para Milei é "um mecanismo pelo qual os políticos fraudam os argentinos".
- Batalha cultural oportunista -
As redes sociais e a chamada "batalha cultural" travada, e que ganhou relevância durante a era Trump, catapultaram a popularidade de Milei.
Esta "batalha cultural" é um conflito ideológico sobre questões como o feminismo, a descriminalização do aborto, os direitos LGBTQIAP+ e a educação sexual. Neste debate, a direita considera-se uma minoria derrotada em nome do "politicamente correto" e reivindica seu direito a uma liberdade de expressão supostamente perdida.
Embora "Milei seja um aliado e em sua coligação existam atores centrais nesta batalha cultural global", a questão "não é algo central em seu discurso", destacou Vommaro. No entanto, ele "participa nisto de forma oportunista, porque percebe que há uma chance de representar setores que não tinham voz política", acrescentou o analista.
Como um de seus assessores ideológicos, o conservador Agustín Laje, que citou que o novo governo buscará "tirar todo o progressismo do Estado, ou seja, os ministérios de gênero, as diversidades, as feministas 'burras' [corruptas], os lobbies LGBT..." no discurso após a vitória do economista de 53 anos.
O olhar nostálgico para o passado também é um ponto em comum entre Trump e Milei.
O argentino vê em Juan Bautista Alberdi, um dos responsáveis pela Constituição argentina do século XIX, como símbolo do primeiro desenvolvimento econômico do país.
"Hoje abraçamos a liberdade para sermos mais uma vez uma potência mundial", declarou ele em seu discurso de vitória.
A.Mahlangu--AMWN